11.1.08

Renovatio

O farfalhar do material plástico denunciava que a incubação já havia começado. Logo, lânguidos gemidos começaram a ecoar, e pequenos solavancos onde outrora havia uma cozinha começaram a se tornar freqüentes.

Não... por favor, ele não...” – foi o único pensamento que pôde passar pela mente do tenente Karl “Nigh” Gaerfner, enquanto observava aquilo que, poucos minutos atrás, fora seu melhor amigo.

-Resiste Was!

Mas, somente gritinhos e gemidos foram em sua resposta. Na mesa, literalmente soterrado por plásticos e outros materiais termo-isolantes, o também Tenente Nikkolai “Was” Heinderrs ainda dava sinais de que sua consciência agüentaria mais. Bem mais. Agüentaria, simplesmente, o pior. Ao redor dele, criaturas o observavam, pacientes, analisando tudo o que lhe ocorria.

Já haviam se passado 4 – talvez 5, ele se corrigiu – dias terrestres, desde que aquela missão diretamente ao circo de aberrações lhes fora sancionada, e ele não poderia deixar de se sentir culpado por tê-los levado deliberadamente até ela. Ele estava triste e melancólico com o final daquela relação que o havia feito saber quem era por grande parte de sua vida, e ele precisava de um pouco de aventura. Portanto, nada mais claro que, quando um sinal fraco mas indistintamente humano fora sentido de um ponto considerado como “terras hermas” do espaço de Zeta, ele seria o primeiro a se oferecer. Claro, quem poderia pensar que um sinal de resgate de uma freqüência tão conhecida poderia significar “armadilha mortal com coisas que possuem corpos”?

Ele fora avisado, é claro. Bem, isto é, se você considerar uma lenda para assustar recrutas da Força Aeroespacial da União como um aviso mais do que consideraria uma daquelas histórias de fantasmas que são vistas, em alta definição, por lobinhos e escoteiros, mostradas por tios imbecis que perdem o tempo comprando esses discos laser.

De todas as histórias que ali foram contadas, desde os dragões de néon que circundam as naves daqueles que estão marcados para morrer em Pégaso-51, até os devora entulhos dos buracos negros, aquela parecia ser a mais improvável. Afinal, quem acreditaria que uma sucata, como a Renovatio – antiga nave-colônia exploradora da União, antes mesmo que a União fosse “A União” – estivesse mesmo possuída pelo mal? Ou, por algum membro da guilda de Anthérion? Ou seja lá o que for que você acha que faz o contrário do que você gosta? Aliás, um mal com um senso de humor muito pobre, para tomar uma nave onde seu nome quer dizer nenascer, renovação, e abrir nela sua fábrica dos horrores.

Mas, ali estava ele, preso, o único dos 4 enviados que ainda usava seu traje espacial, já que era o único que ainda precisava de algum tipo de suprimento de oxigênio. Aliás, segundo lhe constava, ele era o único dos quatro que ainda era humano.

E isto parecia apenas uma questão de tempo.